Magno Borges / Agência Mural
Por: Estela Aguiar
Notícia
Publicado em 20.10.2023 | 15:07 | Alterado em 20.10.2023 | 16:41
Morar sozinho é um passo importante na vida de qualquer pessoa. É estar ciente que mais responsabilidades virão e que se você não tirar o lixo ou descongelar o frango, ninguém fará isso por você.
No Brasil, em 2021, 10,8 milhões de pessoas vivem sozinhas, segundo a Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios).
Ou seja, a quantidade de pessoas morando cada uma no seu quadrado é maior do que as três cidades mais populosas do Estado de São Paulo, tirando a capital da disputa. Sendo elas, Guarulhos, com 1.291.784 habitantes, Campinas, com 1.138.309 moradores e São Bernardo do Campo com 810.729.
Se antes o imaginário de morar sozinho era depois dos 30 anos, alguns jovens das periferias têm antecipado esse sonho por inúmeros motivos, sendo eles para ter a própria independência, relação familiar desgastante ou por morar muito longe do trabalho.
A Agência Mural ouviu três jovens de diferentes periferias de São Paulo que moram sozinhas há mais de 6 meses e dão dicas valiosas de como se organizar para ter o próprio lar. Elas vão desde o planejamento financeiro, até mesmo lidar com a própria companhia.
Se está nos seus planos morar sozinha, o melhor dos mundos é ter uma reserva financeira que te permita maior segurança e estabilidade para iniciar essa mudança, além de ter uma folga nas contas de casa. É o exemplo da Ana Beatriz Motta, 27, que desde os 15 anos sempre sonhou em morar sozinha, no centro da cidade. Antes ela era moradora da Cidade Tiradentes, extremo leste de São Paulo.
A produtora começou no mercado de trabalho aos 18 anos, já com o objetivo de ter um lugar para chamar de seu. “Trabalhei em um posto de saúde e guardava uma grana por mês com esse objetivo de morar sozinha”, relembra.
O planejamento inicial era para ter os itens básicos para iniciar uma mudança sem passar tantos perrengues. “O dinheiro que guardei foi pensando no caução, e de coisas como geladeira, fogão, máquina de lavar, porque não tinha nada e comprei tudo à vista e, depois que me mudei, tive só o aluguel para pagar”, diz.
No caso de Jéssica Marcondes Pires, 23, o planejamento levou um ano. Ela cresceu em Taipas, na zona norte de São Paulo, e se mudou para o bairro da Bela Vista, para ficar mais perto do trabalho. “Ficava a 2 horas do centro da cidade, que é onde trabalho. Decidi me mudar, para ter qualidade de vida nessa rotina pesada de trabalho com advocacia”, diz.
“Fiz uma lista do que seria essencial para a mudança e dediquei 30% do meu salário do quanto poderia pagar de aluguel e coloquei uma meta mensal do quanto guardar para me mudar e ter as coisas de casa.”
Se engana quem pensa que morar sozinha é ter apenas as contas como preocupação.
A funcionalidade e organização de uma casa vai depender da sua atenção constante, ainda mais no período de adaptação, como foi o caso da Jéssica. “Morando sozinha descobri que temos que pedir para a Enel vir ligar a luz, brigar com a Vivo para ter internet de fibra”, comenta.
O dilema de uma rotina vivida em jornada única é saber também concertar as coisas. Nicoly Pinheiro Nascimento, 22, moradora da Fazenda da Juta, zona leste de São Paulo, enfrentou essa situação.
Ela passou a morar sozinha depois quea mãe e o pai se mudaram para outro bairro. “Quebrou o chuveiro, eu tenho que ir atrás. Tenho que saber qual é a pessoa que preciso chamar, quanto cobra, enfim, essas coisas que antes um outro adulto era responsável”, diz a estudante de psicologia.
Se antes as compras surgiam no armário do nada, ou a comida ficava pronta como mágica, morar sozinha também é assumir essas demandas de forma integral. “Achava que contribuía muito quando morava com a minha mãe e percebi que não. Se você passou 24 anos sem saber cozinhar, é porque há 24 anos alguém cozinha para você”, reflete Ana Beatriz.
Na mala da mudança, ainda mais quando se sai de um bairro periférico, a síndrome da impostora acompanha muitas pessoas que estão ascendendo socialmente e que de alguma forma querem vivenciar o próprio sonho.
“Você vai ficar com medo de estar abandonando sua família, mas não está! É possível equilibrar os pratinhos e continuar próxima de quem você ama”
Jéssica Pires, 23
Estar tão longe da família foi o que fez Ana Beatriz pensar sobre solidão, solitude e egoísmo. A produtora, que vem de família grande, conta como é esse processo.
“Minha família era muito presente e ficar muito tempo sem ver ninguém não é fácil. Tenho que separar um dia para ir lá, então ficar longe deles é um desafio mental”, diz.
De um outro lado, para Nicoly morar sozinha também significa ter as próprias diretrizes e seguir o próprio caminho com mais liberdade. “É uma forma de reconstruir quem você é, e de transformar sua casa em um lar com a sua cara. É muito bom chegar em casa, estar em seu próprio silêncio, e você encher sua própria fruteira, receber seus amigos, e definir seus próprios limites.”
Jornalista. É fiel à crença de que da ponte pra cá, o jornalismo é revolucionário. Apaixonada por carnaval, filmes e séries. Correspondente do Jardim João XXIII desde 2019
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