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'Internei minha mãe no Natal e só vi 33 dias depois, sem vida', diz morador de Guaianases

Ricardo Cajé perdeu a mãe de 66 anos; ele é um entre os milhares de brasileiros que sofrem o luto da pandemia da Covid-19

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Arquivo Pessoal

Por: Lucas Veloso

Notícia

Publicado em 26.03.2021 | 11:44 | Alterado em 27.02.2024 | 16:21

Tempo de leitura: 2 min(s)

Guaianases, zona leste de São Paulo. Era 24 de dezembro de 2020 quando o comprador Ricardo Cajé, 37, levou a mãe ao hospital para ser internada. Aos 66 anos, a dona de casa Eliene Meira Alves Cajé não quis ir de boa vontade. O filho diz que o medo dela era estragar o Natal da família, caso tivesse que ficar por lá. 

Apesar de não querer, Ricardo e a esposa convenceram Eliene. “Ela foi com um sorriso, mesmo com a enfermeira preocupada porque ela estava com saturação em 46%”, diz Ricardo. “Ela olhou pra mim e falou assim: ‘não se preocupa. Vai dar tudo certo’.” 

O filho só viu a mãe 33 dias depois, já sem vida. Ela é uma das 272 pessoas que não resistiram à Covid-19 no bairro.

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Ricardo Cajé e mãe Eliene Meira Alves Cajé @Arquivo Pessoal

A saturação é uma das primeiras coisas a serem percebidas pelos profissionais de saúde, pois isso indica o nível de oxigênio no sangue dos pacientes. O ideal é que esse número esteja acima dos 95%. Eliene estava com menos da metade. 

Nascida em Livramento, município da Bahia, Eliene veio para São Paulo aos 17 anos e era conhecida pela bondade. Era capaz de cuidar mais dos outros do que si mesma. Nas palavras do filho, “uma pessoa que levava Deus onde quer que fosse”. 

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Os cuidados começavam em casa, onde ela se desdobrava, em especial com o irmão de Ricardo, Marcos, que é autista e exigia mais atenção. 

“Se tivesse que cuidar de alguém, ela ia cuidar e deixava os cuidados com si mesma para outra hora. Quando lhe pediam dinheiro, dava. Um coração que não cabia no peito. De um amor extremo. Só nos ensinou a amar. Amar uns aos outros cada vez mais”, relembra Ricardo.

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Eliane ao lado do filho Marcos @Arquivo Pessoal

“A sensação de perder minha mãe numa crise sanitária é uma mistura de sentimentos. E todos são ruins, de perdas. É impotência. De você não ter o que fazer, não ter o que buscar, não ver, não ter como dar um um enterro, um velório digno.”

Em casa, antes da internação, Eliene via a pandemia com muita preocupação, segundo os familiares.

Ela tinha um “cuidado tremendo” de chegar em casa e não entrar com a roupa do corpo. Ia direto para o banho, além de espalhar álcool em gel pela casa inteira. Limpar a casa o tempo todo com desinfetante, lavar todas as louças logo após o uso e outros cuidados foram aumentados na tentativa de barrar o vírus ali.

Na tentativa de diminuir o impacto da perda, Ricardo recorre à fé. “Não digo pra ninguém que perdi minha mãe. Falo que eu ganhei uma intercessora no céu”, cita. “Lá de cima, ela roga por essa pandemia, roga por cada um que está sofrendo, cada família. É uma guerreira que descansou.” 

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Família de Ricardo Cajé @Arquivo Pessoal

Até a publicação deste texto, o país contabilizava cerca de 303 mil mortes, sendo que 69.503 das vidas foram perdidas no estado de São Paulo.

Na Grande São Paulo, foram 36 mil vítimas, mas que podem ser mais de 40 mil, pois há 7.000 casos de mortes que ainda são suspeitas – não tiveram resultado do teste.

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Lucas Veloso

Jornalista, cofundador e correspondente de Guaianases desde 2014.

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