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Para driblar pandemia, músico de Ermelino Matarazzo troca vagões por aulas online a crianças na periferia

Morador do Ermelino Matarrazo, zona leste, recorreu ao ensino à distância para dar aulas de violino, viola e violão popular em meio a pandemia

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Por: Gabriela Alves

Notícia

Publicado em 19.12.2020 | 10:53 | Alterado em 18.01.2021 | 19:15

Tempo de leitura: 3 min(s)

O músico João Carlos Souza Almeida, 23, mora em Ermelino Matarazzo, na zona leste da capital. Ele é um daqueles músicos que vez ou outra entram nos vagões para tocar música, principalmente nas linhas Vermelha e Azul.

Na pandemia, a rotina foi interrompida. Ele deixou os vagões por medo de contaminar a filha e os bisavós que moram com ele e decidiu se dedicar ao ensino de música clássica às crianças da periferia.

“Perdi tudo na pandemia, como a minha bolsa já tinha terminado, não fiz mais apresentações nos vagões ou eventos. Solicitei também o auxílio emergencial, que de emergencial não tem nada. Consegui sacar apenas dois meses”, diz.

Nos trens, tocava com o coletivo de instrumentistas Desviolados, que mistura instrumentos eruditos com MPB e clássicos nacionais. Essas eram as principais fontes de renda. O músico também faz licenciatura em música na Unesp (Universidade Estadual Paulista), além de estudos de violão na Emesp (Escola de Música do Estado de São Paulo.

Sem estrutura em casa para aulas, contou com a ajuda de uma professora da universidade para começar. “Parece que veio uma luz. Só tinha o celular para dar as aulas online e para assistir as aulas da faculdade remotamente. E uma professora doou o notebook que uso hoje”. Atualmente, ele tem 16 alunos.

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João Carlos Souza vive em Ermelino Matarazzo, na zona leste

A música sempre esteve presente. Nas recordações de infância, o músico tem a memória do som alto durante as manhãs de domingo, em casa, ritmados pelo samba e o forró. O amor do pai, Heitor Jorge Ramos Almeida, pela música podia ser escutado pelas ruas do Jardim Keralux, bairro de Ermelino Matarrazo, na zona leste de São Paulo.

A partir dos sete anos, Almeida passou a se dividir entre Ermelino Matarazzo, zona leste e Vila Mariana, na zona sul, onde o pai dele começou a trabalhar como zelador.

Aos 11 anos, enquanto estudava na escola municipal Jean Mermoz conheceu o projeto de fanfarras nas escolas do Estado de São Paulo, instituído a partir da Lei Nº 10.451, de 22 de março de 1988.

Na época, João Carlos pensava em tocar percussão, por influência paterna. Porém, as vagas para o instrumento no projeto haviam terminado. “Meu pai falava que já tinha tocado tantan em um grupo de samba, mas nunca ouvi”, brinca.

O interesse pelo violino surgiu a partir de uma apresentação de final de ano no Parque Ibirapuera. “Tinha uma orquestra tocando em um dia que estava lá. Foi a primeira vez que ouvi o som do instrumento pessoalmente. Ficou na minha memória”, relembra.

A maioria das escolas públicas dispunham somente do ensino para instrumentos de banda, mas o  professor de fanfarra conseguiu a doação de instrumentos para formação de orquestra.

“Éramos incentivados a ensinar quem sabia menos. Depois de uns quatro anos, estava ajudando quem começava nas aulas, como segurar no arco e arrumar a postura. Acredito que a partir daí iniciou a minha trajetória como professor, mesmo sem perceber”, conta.

Em paralelo, com 13 anos, começou a estudar no centro de música do Sesc Vila Mariana. Entrou no nível intermediário, até fazer parte da Orquestra de Câmara. Lá, permaneceu até os 20 anos. “Comecei a levar a música a sério aos 15 anos. Eu só queria tocar ”, enfatiza.

Nas rodas de violão com os amigos na adolescência, despertou a vontade de aprender um novo instrumento. “Peguei o gosto e fui aprendendo sozinho. Tocava violão durante quatro horas seguidas e não via o tempo passar”, lembra.

Ele foi aprovado na Emesp Tom Jobim (Escola de Música do Estado de São Paulo) aos 19 anos para estudar violão popular tocando uma peça de samba. Lá, também viu outros ritmos como o bossa-nova e jazz.

No ano anterior, lidou com a morte do pai e voltou para a zona leste com a mãe e o irmão. “A estrutura da família mudou e atualmente somente eu moro aqui. Sentimos bastante”, diz.

Em 2017, descobriu que se tornaria pai: “Me questionei se seguiria na música. Em alguns meses entraria uma criança na parada, precisava de grana. E a gente sempre escuta o quanto é difícil ser músico no Brasil”, explica.

Entre os instrumentos estão aulas de violino, viola e violão popular. “Fui do desespero à salvação”, resume sobre o período de isolamento social. No longo prazo, diz que pretende consolidar um projeto de ensino de música na região.

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Gabriela Alves

Formada em jornalismo, contadora de boas histórias, musicista nas horas vaga (por hobby) e distraída por natureza. Quem é mais sentimental que eu? Correspondente de Guaianases desde 2019.

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