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Copa do Mundo: familiares, amigos, Jardim Fontális e Josimar

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Por André Santos | 17.06.2018

Publicado em 17.06.2018 | 11:06 | Alterado em 22.11.2021 | 17:03

RESUMO

Em relato, correspondente da zona norte relata a relação de sua região com a Copa do Mundo

Tempo de leitura: 3 min(s)

Semana de Copa do Mundo e as mensagens no celular não param de mostrar convites para assistir aos jogos. Os eventos são variados, desde bares na Vila Madalena, Vila Olímpia, Pinheiros, aos eventos como Fan Fests espalhadas pela cidade.

Mas a verdade é que eu não curto assistir à Copa assim. A culpa é do primeiro Mundial que vi. 

Minha primeira lembrança de Copa do Mundo foi em 1986. Estávamos na casa da minha madrinha, Dona Julinda, no recém ocupado bairro do Jardim Filhos da Terra, na zona norte de São Paulo, chamado também de Serra Pelada, em alusão ao grande garimpo que existia no Pará.

Estávamos ao redor de uma pequena TV sobre a geladeira, assistindo à terceira partida da seleção brasileira no mundial do México, quando um chutaço deu início a festa, aos 41 minutos do primeiro tempo de Brasil e Irlanda do Norte.

Os adultos se abraçavam, riam e jogavam cerveja para o alto. Lembro do cheiro de churrasco, da alegria, dos abraços e alguém me levantando acima das cabeças. O jogo já estava 1 a 0 para o Brasil naquela altura, mas o chute gerou uma comoção imediata, uma obra de arte de uma seleção que praticava o futebol arte. Alegria geral.

O jogador na tela parecia nos imitar. Com os braços para cima, ele corria para todos os lados. Era Josimar, lateral-direito do Botafogo, convocado de última hora para o Mundial. Meu primeiro herói.

Não lembro quando começaram a existir as Fan Fests e os telões superdimensionados que atraem milhares de pessoas para ver o torneio, mas a ideia nunca me agradou. Nem quando foi no Brasil em 2014. Talvez porque a cerveja seja cara e não dá pra ouvir a narração. Ou porque junte muita gente, vire festa, azaração. Já com meus amigos o papo não desvia. É futebol.

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Moradores mantêm tradição que começou durante criação dos bairros nos anos 1980 (Magno Borges/Agência Mural)

TURMA

Moro no mesmo bairro desde 1992. A primeira Copa do Mundo que vi no jardim Fontális, também na zona norte, foi em 1994, quando fomos campeões.

Tínhamos poucas televisões no bairro e saiamos de garagem em garagem vendo qual casa tinha colocado o televisor para fora para assistir de ‘convidado’. Meus amigos e eu não possuíamos televisão em casa e foi assim que comemoramos nosso primeiro título. 

O futebol juntou minha turma.

Todas as amizades que tenho desde a infância começaram no campinho de futebol aqui do bairro. Campinho esse que fizemos com nossas próprias mãos. Invadimos as construções e pegamos caibros e madeiras para as traves e ao lado de um rio criamos nosso ‘parquinho’ predileto.

Nossa obra deu tão certo que ainda hoje é a principal praça no entroncamento dos bairros Sobradinho e Recanto Verde, com uma quadra de concreto, em péssimo estado de conservação, no mesmo local onde há mais de duas décadas construímos nosso templo, digo, campo.

Nas Copas seguintes como a de 1998, já havia diversos televisores no bairro. Mas queríamos continuar vendo os jogos juntos, então, estabeleceu-se a tradição.

Aqui tudo que é consumido (cerveja, carne, refrigerante, pinga, limão, açúcar e gelo), é comprado por meio do famoso rateio: R$ 20 de cada um e a boa vontade para revezar na churrasqueira e servir as bebidas, como aprendi naquela Copa de 1986.

Discutimos táticas, jogadores, juízes e qualquer coisa relativa ao jogo. Vimos o tetra e o penta assim, atravessando as madrugadas. Lamentamos muitas derrotas também. Em 2014, não havia saído a primeira rodada de carne da churrasqueira e nem esgotado a primeira cerveja aberta e as esperanças já estavam perdidas contra a Alemanha.

Mas, este ano tem mais.

Lajes e garagens já estão prontas, não vamos sair do bairro para assistir nos lugares da moda. Vamos nos juntar novamente e seguir nosso ritual dos últimos 24 anos, celebrar o nosso encontro e o nosso modo de ver o futebol. E não se trata da dicotomia do que é ser ‘raiz’ ou ‘nutella’. Falo de comunhão.

Hoje a maioria de nós já são pais, tios e tias e estamos passando a tradição para os mais novos, do nosso jeito, que não é melhor nem pior que nenhum outro. Foi assim que aprendemos a ver Copa e assim vamos continuar.

André Santos é correspondente do Jardim Fontális
andresantos@agenciamural.org.br

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