Sheila Costa criou a Alternativa L, com metade do conteúdo sobre o universo lésbico e a outra para as demais siglas LGBT; versão online paga será na Amazon
Divulgação
Por: Vagner de Alencar
Publieditorial
Publicado em 25.11.2019 | 16:00 | Alterado em 22.11.2021 | 16:13
Verão do comecinho de 2014. Sheila Costa, 45, e Simone Almeida, 45, fugiram do cinza de São Paulo para aproveitar o azul do céu e do mar de Bertioga, no litoral de São Paulo.
A boa miragem da praia, porém, não era o bastante para o casal, que está junto há mais de duas décadas. Leitura em meio à brisa era ritual. A única revista à tira-colo era a Marie Claire, segundo Sheila, sem nenhuma página que contemplasse o universo das dupla, oficialmente casada há três anos.
“Fiz uma rápida pesquisa no Google. Havia uma ou outra publicação sobre lésbicas no Brasil. Algumas revistas ativas na França e no Chile, por exemplo, não circulavam mais. Muita coisa que tinha também era só online. Era hora de a gente ter a nossa”, contextualiza Sheila, moradora da Fazenda da Juta, em São Mateus, extremo leste de São Paulo.
Naquele ano, Sheila e Simone decidiram mobilizar outros amigos, também da periferia da zona leste (São Miguel e Guaianases), para lançar a revista Alternativa L, a princípio com assuntos ligados a meninas lésbicas.
O sonho virou realidade após o projeto ser contemplado, com R$ 30 mil, no Vai [Programa para a Valorização de Iniciativas Culturais]”, da Prefeitura de São Paulo.
Com a grana por 12 meses, Sheila e seus amigos conseguiram lançar quatro edições da revista, com tiragem de 2.000 exemplares para cada uma (confira aqui a primeira edição).
“Era uma formato pequeno, que cabia no bolso, mas recheada de conteúdo”, conta Sheila.
“No começo bateu um desespero. Ninguém sabia nada, ninguém era jornalista. Mas era mais alta a vontade de lançar uma revista feita por pessoas LGBTs para pessoas LGBTs, e não apenas de São Paulo”.
Metade dos exemplares era distribuída na capital; em casas e fábricas de cultura, bibliotecas e centros lésbicos. Já a outra, enviada pelos Correios para todo o Brasil.
“As meninas de outros estados solicitavam a revista, e enviávamos para um único CEP”, diz Sheila. “O fato de ter sido gratuita trouxe diferencial porque o jovem pobre não tem poder aquisitivo.”
Os assuntos eram diversos: desde menstruação a feminicídio, além das histórias de vivências de todos os colaboradores.
O conteúdo era produzido por elas e com a ajuda de colaborações voluntárias. Com o tempo, começaram a vir textos de diferentes partes do país: do Amazonas, Paraíba, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Brasília, Minas Gerais, entre outros.
Sheila conta que, desde o início, foram tentando tornar da revista um negócio sustentável.
TODAS AS LETRAS
Professora da rede pública de ensino da Fazenda da Juta, em São Mateus, na zona leste de São Paulo, Sheila começou a levar a “Alternativa L” para a escola.
“Os alunos colocavam debaixo do braço. Trabalhar essa vertente com os alunos, quase como um ‘contrabando’, foi importante para que muitos deles começassem a ver que existem outros LGBTs, que eles não são os únicos, ou doentes”.
Dos alunos veio uma reflexão. Eles questionaram por que ela, que defendia a inclusão, havia criado uma publicação só para meninas lésbicas. Foi quando veio a decisão de incluir “todas as letras”. “Conversei com a equipe e decidimos então criar a seção Ponto G”.
No entanto, 50% do conteúdo continua sendo destinado ao público L. O restante para todas as outras letras: gays, bissexuais e transexuais.
NEGÓCIO
Após quatro fomentos de editais e 18 edições, Sheila e sua trupe decidiram realizar a primeira edição online da revista. A publicação vai ser comercializada por R$ 10 na Amazon. Para a edição, eles conseguiram os primeiros anúncios, de duas editoras e de uma empresa de arquitetura. O objetivo é tornar recorrente a inserção de patrocínios.
“Se não houver muita adesão, a gente vai diminuir um pouco. A ideia é que entre o mínimo possível para pagar os custos básicos”.
“Para além dos preconceitos que ainda existe por quem é LGBT na periferia, existe a vontade de ser representado e é por isso que seguimos. Nosso sonho é manter a revista impressa para que esses jovens tenham acesso e possam se ver.”
Veja outras edições da Alternativa L aqui e aqui.
#PenseGrandeSuaQuebrada é um esforço coletivo do Programa Pense Grande, iniciativa da Fundação Telefônica Vivo, em parceria com o Alma Preta, Desenrola e Não Me Enrola, Historioriama, Periferia em Movimento e a Agência Mural de Jornalismo das Periferias com o objetivo de democratizar a linguagem e o acesso das juventudes periféricas ao ecossistema de #EmpreendedorismoSocial.
Cofundador e diretor de jornalismo da Agência Mural. É jornalista graduado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, mestre e doutor em Educação pela PUC-SP. Foi correspondente de Paraisópolis e escreveu o livro "Cidade do Paraíso - Há vida na maior de São Paulo".
A Agência Mural de Jornalismo das Periferias, uma organização sem fins lucrativos, tem como missão reduzir as lacunas de informação sobre as periferias da Grande São Paulo. Portanto queremos que nossas reportagens alcancem outras e novas audiências.
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