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Famílias lutam contra criminalização e despejos na Favela do Moinho

Há anos a comunidade convive entre a pressão de serem expulsos do terreno e as promessas de reurbanização da área e de saneamento básico

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Por: Redação

Publicado em 24.08.2017 | 21:44 | Alterado em 24.08.2017 | 21:44

Tempo de leitura: 4 min(s)

A Favela do Moinho, localizada no centro de São Paulo, recebeu no início deste mês o seu primeiro “slam”. A disputa de poesia falada, porém, teve um objetivo que transcendia o mero enfrentamento entre os participantes, compostos por moradores da comunidade e apoiadores da causa: prestar homenagem a Leandro dos Santos, morto após uma operação da Polícia Militar na favela no último 27 de junho.

O jovem de 18 anos perdeu a vida depois que policiais da ROTA (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) entraram na comunidade para desmontar um suposto esquema de fornecimento de drogas para traficantes que atuam na região da cracolândia. De acordo com a polícia, houve troca de tiros e os agentes agiram em legítima defesa. Já testemunhas afirmam que o rapaz, que estava sob efeito de drogas, foi apanhado vivo pelos policiais e torturado antes de receber, ao menos, três tiros.

“Mataram ele [o Leandro]. Não teve esse negócio de troca de tiro, não. Teve gente que viu ele sendo arrastado para dentro do barraco, aumentaram o [volume do aparelho de] som e depois saíram com o corpo dele cheio de sangue”, diz um morador que pediu para não ser identificado.

O acontecimento que gerou revolta e protestos dos moradores da comunidade é mais um triste episódio da longa e acirrada disputa entre autoridades públicas e as cerca de 480 famílias que hoje vivem no local. Há anos a comunidade convive entre a pressão de serem expulsos do terreno e as promessas de reurbanização da área e de saneamento básico.

A HISTÓRIA DO MOINHO

A última favela do centro de São Paulo existe há cerca de 25 anos e ocupa a área do antigo Moinho Matarazzo, localizada entre duas linhas de trem da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) e o viaduto Engenheiro Orlando Murgel, no Campos Elíseos, com acesso pela rua Dr. Elias Chaves.

O Movimento Moinho Vivo, organização composta por moradores e parceiros da comunidade, estima que cerca de 1.900 pessoas vivam na favela atualmente. A comunidade, porém, chegou a ter quase três vezes esta quantidade até que dois grandes incêndios destruíram centenas de barracos, em 2011 e 2012, e obrigaram muitas famílias a abandonarem o lugar.

“Estão tentando nos criminalizar, dizer para a população que todo mundo que mora aqui na Favela do Moinho é traficante”, ressalta Alessandra Moji, 30, liderança do Moinho Vivo. “Mas todo mundo aqui sabe quais são os reais interesses deles. Toda essa repressão que está sendo feita aqui há décadas é a mando do mercado imobiliário”, pontua.

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A Favela do Moinho recebeu no início de agosto o seu primeiro “slam”, um campeonato de poesia (Crédito: Agência Pavio)

Alessandra explica que, além de execuções policiais, criminalização de moradores e grandes incêndios, a história da Favela do Moinho está marcada por uma complexa batalha judicial.

A área pertenceu à Rede Ferroviária Federal S/A até 1999, quando, devido a uma dívida de IPTU, o terreno foi a leilão, que resultou no arrebatamento da área pelo empresário Ademir Donizetti Monteiro e a empresa Mottarone Serviços de Supervisão, Montagens e Comércio Ltda.

Um equívoco cometido pelos novos proprietários, porém, ao não registrarem a área em seus nomes, levou a União a ter o domínio das terras depois que a Rede Ferroviária foi à falência. Hoje, os empresários buscam recuperar o local na Justiça, a União pede a anulação do leilão, para acabar com as possibilidades de perder a área, e a Rede Ferroviária aguarda apreciação de seu recurso para readquirir suas posses.

Já os moradores, por sua vez, com a ajuda da assessoria jurídica popular do Escritório Modelo da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), entraram, em 2008, com uma ação coletiva de usucapião, que, se julgada favorável, irá garantir o direito à propriedade às pessoas que vivem no terreno. No mesmo ano, uma decisão provisória da Justiça Federal concedeu a posse para os moradores até o julgamento final da ação, ainda sem data definida.

A determinação judicial, em tese, impediria que os moradores fossem removidos da comunidade. Porém, desde 2007, quando o então prefeito Gilberto Kassab, então no DEM, assumiu a prefeitura, após a saída de José Serra (PSDB) para disputar o governo do Estado de São Paulo, as gestões municipais seguintes vêm tentando adquirir a área e desapropriar o terreno.

Alessandra conta que até mesmo a administração do prefeito petista Fernando Haddad chegou a anunciar planos para erradicar a favela, apesar de uma de suas promessas de campanha ter sido reurbanizar a comunidade, o que incluiria saneamento básico e instalação de sistemas de água e luz elétrica.

“Depois de muitas reuniões com a Sehab (Secretaria de Habitação), ouvimos do próprio secretário [na época, José Floriano] da gestão Haddad que a comunidade seria extinta, mesmo depois dele ter vindo aqui, entendeu? Fez promessas na campanha de que a comunidade toda seria reurbanizada, que iria fazer saneamento dos esgotos. Foi uma decepção”, lembra.

Hoje, diante das afirmações de comandantes da Polícia Militar de que a comunidade é reduto do tráfico de drogas que abastece a cracolândia, os moradores temem ser removidos e levados a regiões periféricas ou mesmo ficar nas ruas.

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