Busca por vaga é desigual entre periferias da cidade; enquanto média é espera por 18 dias em Guaianases, prazo chega a sete meses em Paraisópolis
Por: Lucas Veloso
Notícia
Publicado em 19.02.2020 | 18:09 | Alterado em 26.03.2020 | 11:13
Busca por vaga é desigual entre periferias da cidade; enquanto média é espera por 18 dias em Guaianases, prazo chega a sete meses em Paraisópolis
Tempo de leitura: 4 min(s)Em poucos minutos, a dona de casa Floraci de Souza Costa, 66, indica a localização de ao menos dez creches perto de casa. “É uma em cada canto aqui. Precisa é de criança”, comenta a moradora que tem uma neta matriculada em Guaianases.
A cena ilustra um dos dados mais positivos sobre o distrito que fica no extremo leste de São Paulo.
Ali, os pais de uma criança de zero a três anos precisam esperar, em média, 18 dias para conseguir vaga em uma creche municipal.
Os dados são do Mapa da Desigualdade da Primeira Infância, lançado semana passada pela Rede Nossa São Paulo e pela Fundação Bernard Van Leer. Nele, o distrito foi o melhor avaliado, entre os outros 96 de São Paulo.
Também na zona leste, os distritos de Lajeado e Cidade Tiradentes, tem uma espera média de 24 dias.
A situação é bem diferente em outras periferias da capital. Na zona sul, em regiões como Santo Amaro, Cidade Ademar e Vila Andrade (onde fica a favela de Paraisópolis), a demora por uma vaga na creche pode ser de mais 200 dias, ou seja, quase sete meses.
Um exemplo é o caso de Gabrielle Souza, 22. A atendente, mãe de Davi e Eloisa, tentou vaga para o filho durante um ano e meio em Paraisópolis, no distrito da Vila Andrade.
“Consegui a vaga porque ainda fui na Defensoria Pública para acelerar o processo”, lembra.
Em toda a cidade, há cerca de 350 mil crianças matriculadas na rede de ensino. Segundo números da pasta, esta é a menor fila histórica, com 9.670 crianças aguardando por uma vaga.
CONVÊNIOS
Mas por que a diferença? Sobre Guaianases, a Secretaria Municipal de Educação afirma que as CEI (Centro de Educação Infantil) do bairro atendem mais de 5.000 crianças no bairro, em 47 estabelecimentos.
A gestão diz que a redução nas filas foi possível com convênios e a criação de novas unidades. Entre dezembro de 2016 a dezembro 2019, houve queda de 50,9% na fila de creche da cidade. No distrito de Guaianases, caiu 64%, com a abertura de 160 novas vagas no período.
Há quem questione, por outro lado, o número de educadores disponíveis para o número de crianças e a terceirização desse tipo de espaço.
A velocidade para encontrar a vaga foi confirmada por moradoras do bairro. Stefani da Silva, 25, dona de casa e mãe de duas meninas, lembra que levou cerca de dois dias para conseguir uma vaga na creche para a última filha. “Queria vaga no mesmo lugar da minha outra filha. Levei a documentação, no mesmo dia eu retornei e consegui fazer a inscrição. Uma semana depois ela já começou lá”.
A contadora Flávia Lima, 25, concorda que no bairro não há grande espera por uma vaga. “Foi bem mais rápido do que eu imaginei, cerca de dois dias”, relembra.
‘AS CRECHES NÃO CAÍRAM DO CÉU’
Se hoje Guaianases não tem filas de mães em busca de uma vaga na creche, a situação já foi muito diferente. A história da região mostra que a educação sempre foi uma das principais demandas dos movimentos sociais.
A dissertação “Memórias de Mulheres dos Movimentos Sociais da Zona Leste de São Paulo: Histórias de Resistência” de Vera Aparecida de Oliveira, apresentada em 2007 na USP (Universidade de São Paulo), evidencia que a demanda por creches na região é antiga.
Em conversas com moradoras da zona leste, a pesquisadora relatou que na década de 1970, padres e freiras da Igreja Católica, junto com lideranças comunitárias foram de casa em casa para conhecer as necessidades no bairro, entre três opções: creche, escola e posto de saúde.
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Naquela época, a creche foi indicada pela maioria dos pesquisados como a necessidade prioritária.
Segundo o estudo, o movimento de luta por creche teve seu auge entre 1978 e 1981, com início na zona sul de São Paulo, e depois se expandiu para a zona leste. Após o movimento, foram entregues 36 creches para o município de São Paulo. Antes, eram apenas apenas três, nenhuma na zona leste .
FISCALIZAÇÃO
No segundo semestre do ano passado, a gestão Bruno Covas (PSDB) identificou irregularidades em cerca de 120 creches conveniadas e possíveis desvios de quase R$ 10 milhões.
Algumas unidades, administradas por 35 organizações sociais, acabaram descredenciadas após investigações. A fiscalização começou depois de suspeitas sobre a existência de uma máfia das creches na cidade.
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As investigações indicaram crimes como apropriação indébita, peculato, formação de quadrilha, ocultação de patrimônio, inclusive desvio de merenda das crianças. De acordo com a prefeitura, cerca de 30 creches entre as listadas pertenciam à Diretoria Regional de Guaianases.
COMO FUNCIONA
Em São Paulo, as creches são divididas em três tipos. Existem as Diretas (pertencem à prefeitura), as Conveniadas (particulares que se conveniam com a prefeitura) e as Indiretas (com prédios da prefeitura, mas geridos por instituições particulares).
Atualmente, a Secretaria Municipal de Educação trabalha com dois programas para o atendimento em CEI.
O programa Mais Creche é voltado às crianças que não conseguiram atendimento na Rede Municipal de Ensino. A concessão do benefício corre de forma provisória e emergencial e não ultrapassa o valor de 10% do número de matrículas vigentes no município.
O programa ainda prevê que o pagamento para as escolas não será maior do que o valor per capita destinado para os CEIs parceiros. A supervisão destes espaços é feita por meio das 13 Diretorias de Ensino de São Paulo.
Em dezembro passado, a Prefeitura de São Paulo iniciou o pagamento do programa Bolsa Primeira Infância, que destina o benefício mensal de R$ 200 para famílias em situação de vulnerabilidade social, com crianças entre 0 e 3 anos que aguardam uma vaga nas creches municipais.
Os beneficiários são identificados na hora da busca da vaga, por meio do cadastro no CadÚnico (sistema para identificar as famílias de baixa renda e que estão inscritas em programas sociais como o Bolsa Família).
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