Por: Jacqueline Maria da Silva
Notícia
Publicado em 30.11.2021 | 15:51 | Alterado em 06.12.2021 | 12:40
Não é à toa que a venda de raquetes e incensos de citronela aumentou na banca em que Ageu Rubis Carolino da Silva, 51, trabalha. O jornaleiro mora na mesma rua onde fica o estabelecimento, na Vila Marari, na zona sul de São Paulo, e explica o motivo: “No prédio onde moro, os vizinhos saem no corredor do hall com a raquete porque enche de mosquito. Na hora que a gente abre a banca, já é cheio de pernilongo”.
Ele mora no entorno dos piscinões de Cidade Ademar, os chamados Reservatórios do Córrego do Cordeiro 1, 2 e 3 (RCO), inaugurados em 2015 e 2018, para conter as enchentes na região.
A Agência Mural conversou com moradores das redondezas e quanto mais próximo da estrutura, mais recorrente a queixa de presença de mosquitos, o que se intensificou nos últimos quatro meses. Eles atribuem a infestação a falta de limpeza e água parada nos piscinões.
Claudinéia Miranda de Souza, 39, que o diga. Todo dia antes de sair de casa, a agente comunitária lança inseticida e fecha as portas do domicílio. “Meu filho é alérgico à picada de inseto, então eu vigio muito essa parte”, diz.
Jurandir Martins Fernandes, 65, sabe bem o que é isso e conta que o problema tem tirado o sono dele. “A noite tem bastante mosquito”, diz. “Esse mal cheiro é porque toda a água que sai do rio cai tudo lá dentro [do piscinão], então fica aquela água podre dentro do piscinão que dá até rato aqui”, afirma Jurandir.
Na casa da professora Raquel Chiamenti dos Santos, 39, no Jardim Jabaquara, repelente, raquete, inseticida e outros métodos tentam diminuir os efeitos das picadas. “Acho que está apenas contendo. Você mata, mas daqui a pouco aparece tudo de novo”, comenta.
“Eles descem com a máquina, mas só juntam o lodo no canto e não carregam na caçamba, deixam aí. Chove, espalha tudo de novo e o cheiro vem para casa da gente”, complementa Gilson Lacerda da Silva, 43. Ele recorreu ao incenso de canela na porta de entrada do comércio na Vila Clara, forma que encontrou de tentar barrar a entrada dos insetos.
Flávia do Carmo Anuatti, 51, e outros vizinhos, abriram chamadas na prefeitura pelo 156 pedindo a fiscalização do reservatório.
No entanto, nem mesmo o fumacê feito três vezes pelo controle de Zoonoses, entre agosto e setembro deste ano, foi capaz de eliminar o problema. “Não mudou quase nada. No próprio dia a gente matou vários”, confirma a corretora de imóveis.
Além do incômodo, moradores apontam receio de aumento de doenças como a dengue.
De acordo com dados da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo foram registrados em Cidade Ademar 42 casos de Dengue em 2020 contra 179 em 2021. Também foi identificado um caso de Chikungunya foi identificado, doença que não ocorria na região desde 2019.
Especialista em vetores de arboviroses, como Aedes Aegypti, Tamara Nunes de Lima Camara, aponta que quando não há o esvaziamento total de um piscinão, qualquer quantidade mínima de água pode ser suficiente para virar criadouro dos mosquitos.
O Aedes Aegypti, por exemplo, pode colocar os ovos na parede que envolve a estrutura, enquanto o pernilongo pode colocar os ovos na superfície da água.
Dois estudos desenvolvidos pela Universidade de São Paulo apontam esses riscos. Um deles publicado em 2011, relatou a presença de larvas de pernilongos em piscinões da zona leste de São Paulo. Já uma pesquisa publicada entre 2015 e 2017 identificou larvas de Aedes Aegypti em um sistema subterrâneo de armazenamento de água da chuva do próprio campus.
Segundo Tamara, altas temperaturas aceleram a transformação da larva em mosquito, o que aumenta o número desses insetos e a chance de infecção. Enquanto o desenvolvimento da larva leva de 12 a 14 dias em uma temperatura até 26 graus, esse tempo cai para seis dias, em caso de mais de 30 graus.
“Na ausência de um criadouro de água limpíssima, se o Aedes só encontrar água mais turva, vai colocar os ovos dele ali também”, aponta Tamara.
Além disso, o desnivelamento do terreno e a demora na limpeza do piscinão podem gerar locais de água parada como aponta Silvio Luiz Giudice, gerente da diretoria de engenharia e obras da DAEE (Departamento de Água e Energia Elétrica) do estado de São Paulo, que administra alguns piscinões da região metropolitana de São Paulo como os do Ipiranga e São Bernardo.
Silvio afirma que as limpezas desses equipamentos, geralmente, são programadas para serem feitas entre abril e setembro a fim de preparar o equipamento para os períodos de maior chuva.
Ele alerta que a população pode e deve pedir a inspeção entrando em contato com o órgão responsável, que pode ser a prefeitura, por meio da subprefeitura especifica, ou pela superintendência do DAEE.
“Normalmente tem uma placa com o nome do reservatório, a capacidade, e o departamento que faz a manutenção. Por meio dessa identificação é possível saber para onde direcionar o pedido”, acrescenta.
Apesar disso, a Agência Mural não encontrou identificação nos piscinões visitados que são administrados pela prefeitura.
Sobre a limpeza dos reservatórios, a Subprefeitura de Cidade Ademar afirma que os dispositivos recebem manutenção preventiva das bombas e desassoreamento com limpeza manual e mecanizada desde o início de suas atividades.
A pasta também diz que entre julho e agosto 2021 houve uma paralisação dos contratos que foram retomados no início de setembro.
Repórter da Agência Mural desde 2023 e da rede Report For The World, programa desenvolvido pela The GroundTruth Project. Vencedora de prêmios de jornalismo como MOL, SEBRAE, SIP. Gosta de falar sobre temas diversos e acredita do jornalismo como ferramenta para tornar o planeta melhor.
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