Enquanto velocidade média dos ônibus no bairro de São Rafael é de 12,3 km/h, na capital paulista chega a 15,9 km/h, aponta pesquisa
Matheus Oliveira / Agência Mural
Por: Matheus Oliveira
Notícia
Publicado em 22.02.2023 | 14:00 | Alterado em 27.02.2024 | 17:03
No limite entre os municípios de Santo André e Mauá, o distrito de São Rafael, na zona leste de São Paulo, exemplifica os problemas de mobilidade urbana da capital. A velocidade média dos ônibus no bairro é a mais baixa da cidade, marcando 12,3 km/h, de acordo com o Mapa da Desigualdade 2022 da Rede Nossa São Paulo.
Na capital paulista o índice chega a 15,9 km/h, segundo a mesma pesquisa, enquanto Marsilac, na zona sul, tem a melhor velocidade média com 22,2 km/h.
A soma da baixa velocidade, poucas linhas de ônibus, demora entre as viagens e demora até o destino estão entre as reclamações dos moradores.
“Dependendo do horário, o trajeto demora. A perua (micro ônibus) do Jardim São Francisco até o Shopping Aricanduva demoraria meia hora, mas leva quase uma hora, dependendo do trânsito da Avenida Mateo Bei”, afirma o barbeiro Edson Reis, 45.
Edson trabalha no centro da cidade. Para se deslocar, Reis embarca em um ônibus até o Terminal São Mateus e de lá mais um coletivo para o Terminal Mercado, na região da Sé, e faz o mesmo trajeto para voltar para casa. O percurso leva em média 1h30.
O geógrafo e doutor em geografia humana pela USP (Universidade de São Paulo), Ricardo Barbosa, 45, traz algumas reflexões sobre o desafio da mobilidade. “A velocidade é um parâmetro, porém não é só ela que explica o problema [da mobilidade]. Eu colocaria pelo menos duas outras questões: tempo de deslocamento e acessibilidade”, pontua o geógrafo, morador da zona leste.
Segundo o levantamento da Rede Nossa São Paulo, o tempo médio de deslocamento por meio do transporte público no São Rafael é de 55 minutos, enquanto em Pinheiros é de 25 minutos – o mais baixo da cidade.
Questionada sobre o baixo índice de velocidade dos ônibus no distrito de São Rafael, a SPTrans diz, em nota, que em seus cálculos o índice chega a 18 km/h na região, próximo a média da cidade que está em 17 km/h.
A SPTrans afirma desconhecer o cálculo utilizado pela Rede Nossa São Paulo. Para chegar à velocidade média dos coletivos, a empresa utiliza o “cálculo da extensão total percorrida em quilômetros por todos os ônibus das linhas que operam no local, dividido pelo tempo total, em horas, gasto por esses veículos para percorrer essa distância”, justifica.
A RNSP usou como base levantamentos feitos pela empresa Scipopulis e a organização IEMA (Instituto de Energia e Meio Ambiente). A velocidade foi avaliada pelos “registros de localização dos ônibus da cidade e dos dados de rota de cada linha atendida por eles”.
“Basicamente a velocidade é estimada por trecho entre pontos de ônibus da cidade, a partir de dois registros consecutivos de localização e horário para cada ônibus”, afirma em nota.
A RNSP ainda pontua que “para cada distrito foi então calculada uma velocidade média ponderando as distâncias de cada linha que passa por este distrito”.
O problema da mobilidade em São Rafael não é restrito às linhas da SPTrans. Por estar no limite com as cidades de Santo André e Mauá, os moradores têm acesso a linhas intermunicipais, gerenciadas pela EMTU, do governo do estado.
O autônomo Alexandre Oliveira, 37, utiliza diariamente o ônibus 107 – Jardim Ester/Terminal Santo André Leste para ir trabalhar. Morador do Parque São Rafael há 17 anos, Alexandre indica que o ônibus intermunicipal demora para passar, principalmente aos fins de semana.
“Os ônibus de São Paulo vem logo. O problema é o intermunicipal que demora mais pra passar. Durante a semana a espera é de 20 a 25 minutos. De final de semana é 30, às vezes chega a 40 minutos. Muita gente do bairro usa o ônibus porque Santo André é aqui do lado”, descreve Oliveira.
A pensionista Josefa de Campos, 72, reforça o comentário sobre a demora do ônibus intermunicipal. Ela mora há sete anos no bairro e usa o transporte público entre cidades para ir à casa da filha, que mora na Vila Luzita, em Santo André.
“De sábado é até mais ou menos, mas de domingo, se passa um, pra passar outro demora uma hora. Sem esse ônibus [107], só é possível sair do bairro de Uber ou de carro particular”, reforça Josefa.
Procurada, a EMTU não respondeu à reportagem.
Para o especialista em mobilidade urbana, Ricardo Barbosa, o tempo gasto no transporte faz diferença na vida do usuário. “Se combinar a velocidade baixa dos ônibus com o alto tempo de deslocamento utilizando o transporte coletivo isso amplia ainda mais o problema de desigualdade na mobilidade”, argumenta.
O professor da Unifesp explica que o preço da passagem, a condição do ônibus, e a frequência das viagens são elementos que dificultam e empurram os moradores à imobilidade – a não circular pela cidade. “E a população empurrada à imobilidade traduz muito bem essa ideia de segregação”, acrescenta Ricardo.
O especialista soma os pontos que podem solucionar o problema da mobilidade no distrito de São Rafael e em toda a metrópole. “Priorizar o transporte coletivo de maneira efetiva, maior frequência de viagens de ônibus, repensar o território com a distribuição de serviços, infraestruturas e empregos nos territórios, pois pensar mobilidade é pensar o território, antes de tudo”.
O barbeiro Edson destaca como os problemas na mobilidade do distrito de São Rafael afetam seu cotidiano. “Se melhorasse [o ônibus], teria mais tempo com a família, mais tempo pra descansar, porque o trajeto é doloroso. Os ônibus são muito cheios, não tem como reclamar se a pessoa pisa no seu pé. Chega a ser desumano reclamar do outro”, finaliza.
Jornalista, educomunicador e correspondente de São Mateus desde 2017. Amante de histórias e de gente. Olhar sempre voltado para o horizonte, afinal, o sol nasce à leste.
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